CLAUDIO GALVÃO
[SÓCIO DO IHGRN E BIÓGRAFO]
O valor pessoal, em qualquer modalidade artística, afirma-se muito mais
pela permanência na memória popular que por uma projeção momentânea, muitas
vezes comercialmente manipulada. Os novos “artistas” da área musical têm, em
geral, rápida ascensão, mas em breve se tornam estrelas cadentes. Os recursos
técnicos atuais lhes proporcionam rapidamente altos rendimentos financeiros e
extensa popularidade. Entretanto, muitos grandes, autênticos valores, tiveram
existência modesta, mas legaram à posteridade obras e exemplos de vida dignos
de admiração e respeito.
O Rio Grande do Norte tem um exemplo notável na
vida e obra do musicista Antônio Pedro Dantas, nascido em Carnaúba dos Dantas
em 13 de junho de 1871, (conforme declarou em entrevista ao pesquisador musical
Gumercindo Saraiva, publicada neste jornal nos dias 26 de maio e 2 de novembro
de 1974), falecendo em Natal, em 7 de fevereiro de 1940.
A vida de um artista, músico instrumentista ou
compositor, sempre recebe a influência do meio em que viveu. Tonheca (apelido
familiar comum para os que se chamam Antônio) passou sua infância e
adolescência numa pequena cidade do interior seridoense. Nenhuma escola, nem de
letras e muito menos, de música. Tudo se aprendia em casa, com os parentes mais
velhos. Já em sua infância recebia a influência de seus irmãos, todos músicos
amadores, que tocavam em festas e na igreja, tanto do local como do Acari, a
cidade maior mais próxima.
Evoluindo para Natal, o jovem Tonheca prestou
concurso para regente da Banda do Batalhão de Segurança (a Polícia Militar, na
época) no ano de 1898. Logo para regente? Pretensão, autossegurança,
predestinação? No momento do concurso esnobou da comissão julgadora, quando lhe
perguntaram qual instrumento queria escolher, respondendo: Qualquer um. O senhor
diga qual o que quer. E foi tocando a difícil partitura da prova nos diversos
instrumentos da banda. Primeiro lugar, com vinte oito anos de idade, sem haver
estudado em uma escola de música! Regente da banda de música mais importante do
Estado! Como chegou a esse ponto?
A vida de Tonheca Dantas lhe impôs momentos de
dificuldades financeiras associadas a êxitos em sua carreira, principalmente
como compositor. O autor desta página, que teve a felicidade de escrever e
publicar o livro “A desfolhar saudades – uma biografia de Tonheca Dantas”
(1998) e “Royal Cinema – uma valsa centenária” (2014), estudou cuidadosamente a
vida do musicista e procurou assegurar-se de seu legado. Foram feitas pesquisas
em Natal, cidades do Seridó, João Pessoa, Alagoa Grande, Alagoa Nova e Areia,
na Paraíba, e em Belém, onde o músico residiu de 1909 a 1913, integrando a
Banda do Corpo Municipal de Bombeiros do Pará. A biografia citada registra
sessenta e quatro composições, muitas delas perdidas. Considerar-se Tonheca
como autor de mais de mil composições parece exagero e não pode ser comprovado.
Pouco adiantaria um grande número sem uma grande qualidade. Extrapolando o seu
rincão, está presente em quase todas as bandas de música do País. Sua “Royal
Cinema” partiu do velho cinema da Rua Ulisses Caldas, sendo tocada até na BBC
de Londres, em seu programa para o Brasil durante a 2ª Guerra Mundial. Seus
vibrantes dobrados são presença constante em orquestras e bandas de música,
civis e militares.
Há um quê de saudosismo nas belas melodias de
Tonheca. Ele mesmo deve ter sentido isto, quando nomeou uma de suas valsas como
“A desfolhar saudades”
FONTE – TRIBUNA DO NORTE
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